Precisamos matar o imposto

As razões de fracasso de projetos governamentais variamReprodução

O quanto contraditório pode parecer, que para melhorar a vida de todos nós, e especialmente para eliminar a pobreza no mundo, a solução seria eliminar os impostos. Ignore, por um momento, a questão de se realmente é possível eliminar 100% dos impostos, não é este o mérito. Tente imaginar quantos projetos governamentais começaram para jamais acabar, exigiram orçamentos substancialmente maiores do que aqueles planejados e comunicados à população, foram finalizados anos ou décadas depois do estimado, ou tiveram uma qualidade muito aquém da promessa. 

O número de projetos governamentais inacabados ao redor do mundo revela a escala do desperdício estrutural que os impostos financiam. No Brasil, mais de 14 mil obras públicas estão paradas, segundo o TCU (Tribunal de Contas da União), somando cerca de R$ 144 bilhões desperdiçados. Na Espanha, o aeroporto de Ciudad Real custou mais de €1, bilhão e nunca operou plenamente. Na Escócia, o novo prédio do Parlamento, previsto para custar £40 milhões, saiu por mais de £400 milhões.

As razões de fracasso de projetos governamentais variam, mas algumas das mais comuns são deficiências no planejamento, ou mais precisamente, a falta de interesse político por boas análises; previsões de fluxo de caixa futuro um tanto otimistas, tanto do lado da receita como das despesas, o que faz com que não haja capital para dar continuidade ao projeto; e a descontinuidade política, ou seja, o outro partido ganhou e muda rumo, em outras palavras a falta de uma política de Estado.

Mas talvez a principal razão para o fracasso seja completamente ignorada no debate público. O risco/retorno do projeto não é precificado no sistema de mercado – e isto faz a total diferença. Pense que dezenas de investidores são convocados para avaliar um projeto de ponte que conecta duas cidades; depois da avaliação, nenhum investidor se interessa pelo projeto, em outras palavras, o risco é desproporcional para o potencial de ganho futuro. Esta informação é chave! No processo governamental em geral, nem precisaria realizar tal chamada O investimento seria realizado às custas da população, provavelmente seria um fracasso, o capital desperdiçado, ninguém seria responsabilizado pela falta de resultado e o processo se repetiria novamente.

Os tributos nasceram em contextos históricos muito específicos, quando a concentração de poder era justificada pela necessidade de defesa e organização social. Na antiguidade, reis e imperadores cobravam impostos para financiar guerras, construir fortalezas, manter exércitos e assegurar a ordem dentro de seus domínios — como o imposto agrícola no Egito faraônico ou o tributum romano, criado para sustentar campanhas militares. Nos feudos medievais, os senhores exigiam parte da produção dos camponeses em troca de proteção contra invasores. O tributo, portanto, emergiu como um pacto imposto entre governantes armados e sociedades vulneráveis.

Com o passar dos séculos, o Estado foi expandindo suas funções muito além da segurança e da justiça, assumindo papéis na educação, saúde, previdência, infraestrutura, cultura e até entretenimento. Cada nova “responsabilidade” justificava novos impostos, taxas e “contribuições”. Essa apropriação progressiva de deveres pela máquina estatal elevou a carga tributária global a níveis históricos — em países como França, Dinamarca e Bélgica, supera 45% do PIB.

Mas há caminhos para gastar menos e receber mais. Na Suíça, por exemplo, a população participa diretamente das decisões fiscais por meio de referendos, hoje eletrônicos, o que impõe disciplina e reduz desperdícios. Já o modelo de quadratic funding, criado para financiar bens públicos, valoriza projetos com amplo apoio popular, ampliando o impacto de indivíduos. E ao invés de impostos compulsórios, podemos recorrer a mecanismos de mercado, como debêntures e social bonds, onde projetos disputam livremente o interesse de investidores, com risco e retorno bem definidos, de acordo com o prospecto que descreve de forma transparente o projeto. Quando o cidadão escolhe e o mercado precifica, o dinheiro rende mais e erra menos.

Pense agora, em projetos sociais, que raramente são sustentáveis, porque todos dependem de retirar de forma forçada o capital de terceiros com a justificativa que é para o bem maior. Mas isso leva a sérios problemas. Primeiramente, no pêndulo entre eleições de esquerda e direita, muitos projetos são descontinuados. Imagine duas cidades gêmeas idênticas. Na primeira, o prefeito é um garoto de 29 anos, filhinho do papai, jamais trabalhou na vida, mas por influência da família chegou ao poder. Na segunda, o prefeito tem 55 anos, já foi prefeito no passado e fez um trabalho esplêndido, além é claro, de ser executivo de carreira de grandes empresas. Os dois vão ao mercado pedir 100 dinheiros para um projeto, no primeiro o mercado não aceita investir, quando no segundo sim – ou seja, existe um mecanismo de check & balance. O prefeito inexperiente teria que fazer mudanças substanciais para ter a confiança dos investidores, o segundo já a tem. Porém, não é assim que funciona na vida real – os dois terão a mesma verba pública, um investirá com responsabilidade, conhecimento e experiência enquanto o outro não. 

A visão bem intencionada é linda, por princípio, mas um desastre na prática. Por exemplo, imagine dez grupos de populações pobres na mesma região. Entre eles existem os mais miseráveis e os “ricos” entre os pobres (por exemplo, pessoas que receberam uma boa educação mas fugiram de zonas de conflito e estão em situação precária). A filosofia predominante é de ajudar os que estão em pior situação, pois sofrem mais além de serem os mais vulneráveis. Em contraste, a visão de mercado seria investir onde há a maior chance de sucesso com o melhor retorno. 

Ao fazê-lo, teremos mais sucesso em trazer capital adicional para novos projetos a ponto que eventualmente teremos o suficiente de capital para ajudar todos que querem ser ajudados. Com a experiência adquirida poderemos reduzir a exposição de risco do investidor, tornando projetos futuros mais atrativos. Isso seria a industrialização do processo de erradicação da pobreza. 

É fundamental também que as pessoas queiram ter sucesso, não é possível impor um projeto social e esperar que dê certo – mas é isso que acontece corriqueiramente. Em contraste, Nova York, ou São Paulo como cidades de imigrações onde pessoas vinham fundamentalmente para trabalhar – este era o mindset das cidades que as levaram ao sucesso. Em contraste, migrações unicamente por propósito de “receber direitos” – estão fadadas ao colapso. Em outras palavras, reformar zonas existentes é mais arriscado do que criar novas cidades onde é possível através de processo seletivo, decidir quem está apto para fazer parte. 

Outros modelos mais “justos” como escolha aleatória apenas aumentam o risco de fracasso do projeto, sem aumentar o retorno, portanto devem ser descartados. A inveja natural do ser humano, e nossa tendência de copiar o que funciona facilitarão o processo de replicação – mas apenas se tivermos um sucesso inquestionável. 

Ao entender que qualquer projeto beneficente e social, tem que fazer parte de um processo produtivo que cria um produto ou serviço que outro queira adquirir, estaremos remunerando o investidor, garantindo a sustentabilidade do projeto, e sendo como o pólen para abelhas, quando se trata de atrair mais capital. Não é fácil, e nem confortável escrever um artigo que basicamente diz que projetos sociais em geral foram mal arquitetados. Porém, com toda humildade precisamos entender que não se trata de nós, mas deles – e, por eles, precisamos atualizar nosso sistema de governança e tributos para algo fundamentalmente mais eficiente. Precisamos matar os impostos, e dar a vida ao Investimento Público Participativo e de Mercado (IPPM).

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No dia 28 de maio, a Prime Society realizará, em São Paulo, o evento “Cidade 5.0 – Quando a Erradicação da Pobreza é um Bom Negócio”, para dar início a essa transformação e buscar soluções concretas para um problema que assombra o Brasil há séculos. Participe e seja parte da mudança!

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