Mulheres que Ganham Mais que Maridos Enfrentam Tensão no Casamento

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Visões tradicionais sobre quem deve ganhar mais em um casamento heterossexual continuam profundamente enraizadas. Novas pesquisas revelam que os relacionamentos frequentemente sofrem quando as mulheres ganham mais que seus parceiros homens. Até mesmo pessoas de fora veem essas relações como menos estáveis, menos satisfatórias e mais propensas ao divórcio.

A ideia de que os homens devem ganhar mais do que suas esposas ainda exerce forte influência sobre a forma como as pessoas enxergam os relacionamentos.

A desigualdade salarial de gênero persiste: as mulheres ganham cerca de 82,7 centavos para cada dólar recebido por um homem, de acordo com um estudo de 2023 realizado nos EUA. No Brasil, mulheres recebem, em média, 20,9% a menos, segundo relatório divulgado pelo Ministério do Trabalho.

No entanto, os avanços são constantes e estudos mostram que cada vez mais mulheres são as principais provedoras em casa. Em 2022, elas eram responsáveis por 49,1% dos lares brasileiros – 10 anos antes, o percentual era de 38,7%.  Nos Estados Unidos, estima-se que entre 31% e 37% das mulheres sejam hoje as principais responsáveis pela renda familiar. No Canadá, 26% das mulheres ganham mais que seus parceiros e, no Reino Unido, esse percentual chega a 31%.

Estereótipos persistem

Apesar dos avanços femininos no mercado de trabalho, novas pesquisas indicam que os estereótipos sobre relacionamentos continuam ultrapassados. Ainda é comum ver os homens como provedores e as mulheres como cuidadoras — o que faz com que relacionamentos em que as mulheres ganham mais pareçam algo “fora do natural” para algumas pessoas.

Uma pesquisa publicada na revista acadêmica internacional Sex Roles, focada em gênero, analisou esse cenário por meio de uma investigação em três frentes: análise de mídia, experimentos com mais de 2 mil participantes e entrevistas com mais de 500 casais. Todos os dados se referem a casais heterossexuais.

No levantamento, os pesquisadores descobriram que, conforme as mulheres contribuíam com uma fatia maior da renda doméstica, a satisfação com o relacionamento caía — especialmente para os homens. Aqueles que ganhavam menos do que suas parceiras relataram sentimentos de inadequação e uma percepção reduzida de sua masculinidade, fatores diretamente associados a uma percepção mais negativa do relacionamento. Já as mulheres que sustentavam financeiramente a casa também expressaram algum desconforto por romperem com os papéis tradicionais de gênero — embora de forma menos intensa do que seus parceiros.

Os pesquisadores também avaliaram a visão de terceiros sobre casais em que a mulher ganha mais que o homem. Em um experimento com mais de 2.400 participantes, foi apresentado o mesmo cenário: um casal casado, com um bom relacionamento, interesses em comum e que se conheceu no trabalho. A única variável era a renda. Metade dos participantes foi informada de que o homem tinha o salário mais alto; a outra metade, que era a mulher quem ganhava mais.

Quando a mulher era descrita como a de maior renda, os participantes classificaram o relacionamento como menos satisfatório e mais propenso ao divórcio. Como esse era o único fator que mudava, os resultados indicam que muitas pessoas ainda associam o sucesso conjugal ao papel masculino de provedor.

Por fim, a análise de 94 reportagens e artigos de revistas sobre mulheres provedoras revelou que a mídia frequentemente retrata esses relacionamentos como anormais ou problemáticos. As mulheres são apresentadas como transgressoras dos papéis de gênero tradicionais, enquanto os homens aparecem como pouco ou menos masculinos. Segundo os autores da pesquisa, esse tipo de narrativa não apenas reflete os valores culturais atuais, como também contribui para perpetuá-los.

Os resultados mostram o quanto o modelo do “homem provedor” ainda está enraizado na sociedade. Como consequência, muitas mulheres acabam se sentindo pressionadas a escolher entre uma carreira de sucesso e um casamento estável.

Mulheres provedoras ao longo da história

Curiosamente, a ideia de que o homem deve ser o provedor é relativamente recente na história da humanidade. Durante muito tempo, vivíamos em sociedades de caçadores-coletores, e há indícios de que as mulheres contribuíam igualmente em relação aos homens. Pesquisas mostram que a coleta, feita principalmente por elas, representava a maior parte da dieta desses grupos, e muitas mulheres também participavam da caça.

Mais tarde, no período Neolítico, mulheres tiveram papel central no surgimento da agricultura, plantando e processando alimentos. Ainda assim, o estereótipo de que é natural o homem ser o provedor permanece amplamente disseminado.

Se as mulheres um dia alcançarem a paridade salarial, é provável que pelo menos metade dos casamentos heterossexuais passem a ter esposas como principais provedoras. Até lá, permanece a incerteza sobre por quanto tempo ainda vamos sustentar expectativas tradicionais a respeito de quem deve ser o principal responsável pela renda familiar.

*Kim Elsesser é colaboradora sênior da Forbes USA. Ela é especialista em vieses inconscientes de gênero e professora de gênero na UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles).

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