Estudo revela impactos do amianto na saúde de moradores de cidades do sudoeste da Bahia


Amianto é uma substância mineral encontrada na natureza e, apesar ser usado como material de construção, é altamente prejudicial à saúde humana. Estudo revela contaminação de pessoas por amianto na Bahia
O Ministério Público do Trabalho (MPT-BA) divulgou, na terça-feira (8), os resultados de uma pesquisa que indica impactos da exposição de 65 mil moradores de cidades do sudoeste da Bahia ao amianto, mineral fibroso que pode causar câncer e outras doenças graves.
O estudo, realizado em setembro de 2024, apontou que é alta a possibilidade de grande parte da população dos municípios de Bom Jesus da Serra, Caetanos, Poções e Planalto terem alguma doença relacionada ao minério.
O amianto é um mineral usado em produtos como caixas d’água, telhas onduladas, tubulações, discos de embreagem, mangueiras, papéis e papelões. As microfibras do mineral penetram nas vias respiratórias e podem acarretar doenças graves, como o câncer de pulmão.
No Brasil, a utilização do mineral, em específico na sua forma de fibra tipo crisólita, foi banida em 2017 após resolução do Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), todas as variedades de amianto causam câncer, e estima que cerca de 50% das mortes pela doença ocupacional estão associadas à exposição a fibra. Além disso, indica que não existe limiar seguro para a exposição humana.
Do total de 584 pessoas expostas ao mineral na região, que receberam avaliação médica e de imagem, 66 foram diagnosticadas com uma ou mais doenças relacionadas ao amianto. Entre a população atendida, 30% afirmaram ter tido exposição ocupacional ao mineral cancerígeno, enquanto os outros 70% foram expostos através do ambiente contaminado.
A população examinada, no entanto, representa menos de 1% do total de habitantes da região, que fica em torno de 65 mil pessoas, portanto é alta a possibilidade de mais enfermos.
As secretarias municipais de saúde da região, com apoio do Ministério Público do Trabalho (MPT), e em cooperação com a Associação Brasileira de Expostos ao Amianto (Abrea), a Associação das Vítimas Contaminadas pelo Amianto e Famílias Expostas (Avicafe), realizaram ação de rastreamento de doenças relacionadas ao amianto (DRA).
O diagnostico contou com a cooperação das equipes médicas do Instituto do Coração de São Paulo (Incor), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Hospital do Câncer de Barretos.
LEIA TAMBÉM:
Desativada há mais de 50 anos, mina de amianto oferece riscos à população no sudoeste da Bahia
Justiça condena empresa do grupo Eternit a pagar R$ 500 milhões para tratamento de contaminados com amianto na BA
Contaminados por amianto, moradores do sul da BA ganham direito a prioridade no recebimento de indenizações
As pessoas examinadas foram submetidas à tomografia computadorizada de baixa dose de radiação, recomendada para ações de rastreamento de câncer de pulmão e com radiação menor. Ela é capaz de identificar algumas doenças pulmonares e sugerir a realização de exames complementares, especialmente para cânceres, em seus estágios iniciais.
Mina de São Félix, em Bom Jesus da Serra
Reprodução/TV Sudoeste
Exploração de amianto
O estudo foi realizado em virtude da região sudoeste do estado ter sido um polo de exploração do amianto por quase 30 anos, através da mina de São Félix, em Bom Jesus da Serra, ativa entre 1939 e 1967. Inicialmente operada pelo grupo francês Saint-Gobain, representada no Brasil pela empresa Brasilit, a mina passou para o controle da empresa Sama, que integra o grupo da Eternit S.A.
Com operações encerradas desde 1969, não foram promovidas ações de remediação ambiental efetivas até o momento. Há uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) com recursos judiciais pendentes.
Segundo o MPT, mesmo com a mina fechada há quase 60 anos, o relatório aponta a presença inequívoca de contaminação do meio ambiente. Casas, fundações de edifícios, estradas e até mesmo lápides de cemitério foram construídas e pavimentadas com pedras de amianto, doadas pela empresa para a prefeitura e residentes da região.
A área descoberta passou a servir de lazer para a população, que se banhava e realizava piqueniques no entorno, mas nada foi feito para impedir a dispersão das fibras do mineral no ar.
O médico da divisão de pneumologia do Instituto do Coração (InCor), do Hospital das Clínicas da USP, Ubiratan de Paula Santos, explicou como se dá o problema da contaminação por amianto no local.
“O amianto está presente nos trabalhadores da mina, em seus familiares e em todos os moradores locais. Isso porque a mina foi desativada em 1969, mas empregou milhares de homens, que moravam ali com suas crianças e mulheres. A fábrica também doava pedras de amianto para as pessoas levarem para casa, usarem nos quintais, nos pisos, no calçamento da rua”, afirmou.
Conforme o MPT, a avaliação clínica resultou em recomendações para o poder público, indicando como dar continuidade aos cuidados. Os serviços municipais de saúde deverão continuar o acompanhamento dos diagnosticados com as DRA, encaminhando aos serviços secundários e terciários os casos que requeiram maiores cuidados.
Será estabelecido um cronograma para repetir os exames periodicamente e fornecido acompanhamento das pessoas que que tiveram resultados dentro dos padrões de normalidade. Todos os examinados deverão repetir a espirometria ainda em 2025 e o exame de raio X em 2026.
Outro resultado do trabalho de avaliação é um conjunto de recomendações ao poder público, nas esferas municipais, estadual e federal. O documento inca que o poder público deverá registrar os resultados em bases de dados como Sinan, SIM e Datamianto, montando um fundamento para futuras políticas públicas.
Também deverá realizar esforços para a criação de um centro regional especializado em doenças pulmonares, com a infraestrutura necessária para o diagnóstico e tratamento.
Mina desativada há 50 anos ainda traz risco à população de Bom Jesus da Serra, no sudoeste
Veja mais notícias do estado no g1 Bahia.
Assista aos vídeos do g1 e TV Bahia 💻
Adicionar aos favoritos o Link permanente.