Negócio da Índia: País disputa espaço no mercado financeiro; veja como investir

Nos últimos anos, a Índia ganhou espaço no cenário econômico. A começar pelo tamanho da população: em abril de 2023, a nação se tornou a maior do mundo, ultrapassando a China em número de habitantes. As estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU) contabilizam 1,428 bilhão de habitantes na Índia, ante 1,425 bilhão na China.

Além disso, o Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta que a Índia deve ultrapassar o Japão ainda em 2025, garantindo o posto de quarta maior potência econômica mundial, com um crescimento na média de 7%. O Produto Interno Bruto (PIB) da Índia registrou crescimento de 6,2% no terceiro trimestre fiscal de 2024 (outubro a dezembro).

Parte do crescimento indiano pode ser atribuída à situação econômica da China. O país tem se beneficiado da recuperação lenta da economia chinesa no pós-Covid, agravada pela perda de capital estrangeiro — impulsionada pela crise no setor imobiliário e pela queda nas exportações — e pelas incertezas decorrentes da guerra comercial com os Estados Unidos.

Will Landers, Head de Third Party Distribution do BTG Pactual, destaca que a Índia começou a ganhar mais espaço globalmente quando a China deixou de ser o destino preferido de investimentos.

“Vimos isso com os fundos de pensão — especialmente os chineses, que tendem a ser todos institucionais e americanos, bem diversificados. Houve uma mudança significativa na alocação que eles tinham na China, porque foram alguns dos últimos a sair de lá e migrar para a Índia. Esses fundos chegaram a investir mais de US$ 4 bilhões em fundos mútuos indianos, de vários gestores”, afirma.

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E o maior impulsionador do crescimento indiano é interno, com políticas de incentivo à produção em diversos setores, especialmente em componentes eletrônicos, inteligência artificial e infraestrutura. O primeiro-ministro Narendra Modi, no poder desde 2014 e atualmente em seu terceiro mandato, tem a ambição de transformar a Índia em uma economia de US$ 5 trilhões até 2025.

“Nos últimos anos, a Índia implementou reformas econômicas estruturais significativas destinadas a melhorar o ambiente empresarial. Estas reformas abrangem a liberalização das restrições ao investimento estrangeiro, a atualização da legislação trabalhista e em matéria de falências, a abolição da tributação retroativa e a substituição dos impostos estatais sobre as fronteiras por um imposto nacional sobre bens e serviços”, diz o Santander em relatório.

Os analistas da Janus Hederson destacam que o objetivo do governo indiano para alcançar o status de mercado desenvolvido é aumentar a contribuição da indústria e das exportações para a produção econômica.

“O momento não poderia ser mais oportuno, visto que a reconfiguração dos fluxos comerciais globais tornou a Índia um destino viável para a manufatura avançada”, afirmam Matthew Culley, Julian McManus, Divyaunsh Divatia e Matthew Doody.

Além disso, o país conta com uma população jovem em crescimento, garantindo mão de obra para as próximas décadas. Estima-se que até 40 milhões de pessoas entrarão na força de trabalho nos próximos anos.

Paralelamente, a renda média da população tem aumentado, impulsionando o consumo. Dados da People Research on India’s Consumer Economy indicam que a classe média tem sido um dos grupos de renda que mais crescem na última década, saltando de 300 milhões para 520 milhões de pessoas. A expectativa é que esse número chegue a 1,16 bilhão em 2030, movimentando cerca de US$ 8,8 trilhões.

Não à toa, grandes empresas estão ampliando suas operações na Índia. A Tesla planeja investir até R$ 3 bilhões no país, principalmente para a construção de uma nova fábrica. A Foxconn, principal fornecedora da Apple, também avalia investir mais de US$ 1 bilhão em uma nova planta, com a intenção de transformar a Índia em um centro global de fabricação de iPhones até 2025.

Entre 2013 e 2023, a Índia recebeu US$ 595 bilhões de investimento estrangeiro direto, segundo a Agência Nacional de Promoção e Facilitação de Investimentos do país. E o plano é aumentar esses números. No seu discurso sobre o orçamento, em fevereiro, a Ministra das Finanças indiana, Nirmala Sitharaman, destacou que o país está negociando tratados bilaterais de investimento com países parceiros.

Boom do mercado acionário e festa dos IPOs

Em setembro de 2024, a Índia superou a China em participação no Índice MSCI All Country World Investable Market Index (ACWI IMI), que rastreia ações de todo o mundo disponíveis para investidores. A participação indiana subiu para 2,35%, enquanto a chinesa ficou em 2,24%. No mesmo período, a Índia também ultrapassou a China no MSCI Emerging Market Index.

Atualmente, o mercado acionário indiano tem capitalização de US$ 5 trilhões, sendo o quinto maior do mundo, atrás apenas de Estados Unidos, China, Japão e Hong Kong. Esse número tende a crescer rapidamente: o Jefferies Financial Group estima que o mercado pode atingir US$ 10 trilhões até 2030.

Já o Goldman Sachs projeta uma alta de 8% do índice Nifty 50 — índice das 50 maiores e as empresas de maior liquidez cotadas na bolsa indiana — até setembro de 2025, impulsionada, principalmente, pelo crescimento dos lucros corporativos.

“O mercado indiano vem entregando na última década cerca de 10% de retorno anual em dólares, quase como um relógio. Às vezes um pouco mais, às vezes um pouco menos, mas sempre de forma bem consistente”, aponta Landers.

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O boom no mercado acionário foi tão expressivo que, em 2024, a Índia se destacou no volume de ofertas públicas iniciais (IPOs). No ano passado, 290 novas empresas estrearam na National Stock Exchange of India (NSE), levantando US$ 7,75 bilhões — superando os US$ 7,35 bilhões arrecadados em 238 IPOs no ano anterior.

O mercado acionário indiano, tradicionalmente dominado por empresas de varejo, também atraiu grandes estreias do mercado financeiro, como a da Bajaj Housing Finance. Em setembro de 2024, a empresa de financiamento imobiliário arrecadou US$ 782 milhões, atraindo US$ 40 bilhões em lances antes de sua estreia.

O executivo do BTG considera a diversificação da bolsa indiana uma vantagem, sendo que nenhum setor dominando mais do que 15% a 20% do total. Ou seja, não há uma dependência excessiva de commodities ou de estatais.

Além disso, empresas estrangeiras também estão olhando para a Índia como uma opção de listagem. A Hyundai Motor Índia, subsidiária da Hyundai Motor Company, lançou o maior IPO da história do país, movimentando US$ 3,3 bilhões em outubro.

“Dado o tamanho da economia local, muitas companhias globais acabam listando suas divisões indianas na bolsa local. Um exemplo é a Suzuki: a operação indiana da empresa tem hoje um valor de mercado maior que o da matriz no Japão. Isso mostra o peso e o potencial do mercado indiano”, afirma Landers.

Nem tudo são flores no Ganges; e o Brasil nessa história?

Apesar do crescimento acelerado, os analistas alertam a economia da Índia ainda não tem capacidade para absorver tão rápido todo o capital que sai da China ou substituir integralmente o mercado chinês, cuja economia é cerca de cinco vezes maior.

“Quando você observa o poder aquisitivo da população indiana, ele ainda está atrás do chinês, uma vez que a Índia tem uma parcela significativa da população vivendo abaixo da linha da pobreza, o que mostra que há muito espaço para desenvolvimento”, destaca o executivo do BTG.

O país também está na mira dos Estados Unidos. Antes de pausar as tarifas recíprocas por 90 dias e suspender as taxas sobre componentes de tecnologia, Donald Trump anunciou uma taxa de 27% sobre os produtos importados da Índia, o que afeta as cadeias de produção das big techs caso a guerra comercial siga em frente.

Além disso, algumas teses afirmam que o mercado de ações indiano está sendo negociado a um múltiplo preço/lucro superior a 21 vezes, o que é considerado caro. No entanto, Landers aponta que não é “totalmente correto” dizer que o mercado da Índia está caro simplesmente por causa dos múltiplos.

“Sem dúvida, a Índia não é o mercado mais barato — está mais cara do que o Brasil ou do que outros países da América Latina —, mas está entregando um crescimento mais consistente, com menos risco. Então, você está sendo remunerado por pagar múltiplos mais altos em troca de um risco geopolítico e macroeconômico menor”, diz.

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Por mais que o dinamismo indiano possa ofuscar oportunidades de investimento em outros mercados emergentes, o executivo não vê como um problema do ponto de vista do Brasil.

“Eu diria que o Brasil tem uma vantagem: do ponto de vista geopolítico, está mais alinhado com a Índia do que com Rússia ou China. Então, quando há realocação de capital, o Brasil tende a se beneficiar — não necessariamente porque alguma coisa excelente aconteceu por aqui, mas porque o investidor está saindo de mercados mais desafiadores. A vida nos EUA, por exemplo, virou uma bagunça nos últimos meses, e os investidores que já ganharam muito dinheiro por lá na última década agora estão reavaliando. Assim, mercados que ficaram para trás — como Brasil e Europa, especialmente dentro do universo emergente — começam a performar melhor”, destaca.

Como investir na Índia

Uma das formas de acessar o mercado indiano é por meio de fundos de índice (ETFs) que replicam o desempenho das ações do país. Entre eles, destacam-se o MSCI India (INDA) e o MSCI India Small (SMIN), disponíveis nas bolsas de Nova York.

No Brasil, a B3 negocia o BNDA39, um BDR que representa o ETF INDA, permitindo exposição ao mercado acionário indiano sem necessidade de operar diretamente no exterior.

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