Técnica com lasers pode melhorar fabricação de chips a nível atômico

Cientistas da Universidade de Massachusetts Amherst desenvolveram uma técnica inovadora que permite alinhar componentes de chips semicondutores com precisão atômica. A nova abordagem, que utiliza lasers e metalentes para criar padrões holográficos, consegue detectar desalinhamentos tão pequenos quanto 0,017 nanômetros — menos que o tamanho de um átomo —, superando drasticamente os métodos convencionais de fabricação de semicondutores.

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A pesquisa, publicada na revista científica Nature Communications, pode ser um avanço importantíssimo para a indústria de microeletrônica, que tem enfrentado desafios significativos para continuar a miniaturização de componentes seguindo a Lei de Moore. Com o esgotamento das possibilidades de chips 2D convencionais, a integração tridimensional de chiplets tem se apresentado como o caminho mais promissor para o futuro da indústria.

O método, denominado “alinhamento holointerferométrico”, utiliza marcas especiais de alinhamento feitas de metalentes concêntricas gravadas nas superfícies dos chips. Quando iluminadas por um laser, essas metalenses geram padrões de interferência holográficos que podem ser analisados para determinar com precisão extrema qualquer desalinhamento entre camadas de componentes.


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Limitações da técnica tradicional de alinhamento

Os métodos atuais de alinhamento de camadas em chips semicondutores enfrentam sérias restrições. Tipicamente, são empregados microscópios para identificar marcas de referência (geralmente na forma de cruzes ou cantos) em cada camada, tentando sobrepô-las com a maior precisão possível.

À esquerda: Camadas semicondutoras empilhadas usando metalentes concêntricas como marcas de alinhamento. À direita: laser passa através dessas marcas para projetar um holograma. O alinhamento ou desalinhamento das lentes determina a aparência do holograma (Imagem: Reprodução/Amir Arbabi)

“A abordagem tradicional para alinhar duas camadas é olhar com um microscópio para marcas nas duas camadas e tentar sobrepô-las”, explica Amir Arbabi, professor associado de engenharia elétrica e de computação na UMass Amherst e autor sênior do estudo. O problema é que o microscópio não consegue visualizar simultaneamente as marcas de referência em camadas distantes, pois o espaço entre elas pode chegar a centenas de micrômetros.

Além disso, quando os técnicos reajustam o foco entre camadas, introduzem oportunidades para os chips se moverem e desalinharem ainda mais. Outro limitante é que a resolução máxima de um microscópio óptico é restrita pelo limite de difração, em torno de 200 nanômetros, muito acima da precisão necessária para as tecnologias atuais de fabricação de semicondutores.

Como é a nova técnica de alinhamento com lasers

A técnica desenvolvida pelos cientistas da UMass Amherst funciona através da criação de marcas de alinhamento especiais compostas por metalentes concêntricas com aberturas anulares, cada uma com diferentes distâncias focais.

Essas metalenses são gravadas nas superfícies dos chiplets ou camadas que precisam ser alinhados. Quando um feixe de laser incide normalmente sobre estas marcas, são formados dois telescópios paralelos que geram dois feixes anulares. Se as marcas estiverem perfeitamente alinhadas, os feixes são projetados paralelamente; caso contrário, são desviados em diferentes ângulos.

O sistema captura os padrões de interferência holográficos resultantes usando uma câmera simples focada no infinito. A análise desses padrões revela informações extremamente precisas sobre qualquer desalinhamento nos três eixos espaciais (x, y e z):

  • Um desalinhamento lateral faz com que o padrão de interferência se torne assimétrico ao longo da direção do deslocamento
  • Um desalinhamento axial (distância entre camadas) desfoca os hologramas e seus padrões de interferência
Padrões de interferência de de 1 micrômetro (ou 1.000 nm) simulados e medidos para diferentes desalinhamentos laterais e axiais (Imagem: Reprodução/Amir Arbabi)

O mais impressionante é que esse sistema consegue detectar desalinhamentos laterais de apenas 0,017 nanômetros e desalinhamentos axiais de 0,134 nanômetros — uma precisão mais de 588.000% maior que as expectativas iniciais dos pesquisadores, que visavam atingir 100 nanômetros.

Entenda a importância dessa nova técnica

A importância desta nova técnica reside primeiramente na superação das barreiras físicas que limitam os métodos tradicionais de alinhamento. Enquanto a indústria de semicondutores avança para nós tecnológicos cada vez menores, a precisão de alinhamento se torna cada vez mais crítica.

“Considere que você tem dois objetos. Ao observar a luz que passa através deles, podemos ver se um se moveu em relação ao outro pelo tamanho de um átomo”, destaca Arbabi. Esta capacidade de detecção ultraprecisa é indispensável para viabilizar a próxima geração de chips 3D e heterogêneos.

Além disso, o método não possui partes móveis e pode detectar desalinhamentos entre duas camadas distantes em escala muito menor que os sistemas atuais, eliminando uma série de problemas mecânicos e ópticos que afetam as tecnologias de produção convencionais.

Por que o alinhamento de chiplets é tão importante em semicondutores?

O alinhamento preciso de chiplets hoje é uma uma grande questão para o avanço da indústria de semicondutores por várias razões. Primeiramente, à medida que a indústria atinge os limites físicos da miniaturização em chips 2D tradicionais, o empilhamento 3D emerge como a estratégia mais promissora para continuar aumentando o desempenho e a densidade dos componentes.

Com alinhamento preciso a nível atômico, fabricantes poderão entregar semicondutores mais econômicos e mais potentes (Imagem: Reprodução/Intel)

Para construir um chip 3D funcional, várias camadas de chips 2D precisam ser empilhadas e conectadas. Estas camadas devem ser alinhadas com extrema precisão — até dezenas de nanômetros — em todas as três dimensões espaciais. Qualquer desalinhamento pode causar falhas de conexão entre os componentes, interferência entre sinais ou mesmo curto-circuitos.

Maryam Ghahremani, doutoranda e autora principal do estudo, explica que o alinhamento preciso é essencial: “As menores características que você pode resolver com métodos tradicionais são limitadas pela difração, em torno de 200 nanômetros”. No entanto, os transistores modernos em chips avançados têm dimensões muito menores, exigindo técnicas de alinhamento igualmente mais precisas.

Além disso, o empilhamento 3D de chips permite combinar tecnologias diferentes (por exemplo, lógica, memória, sensores) em um único pacote, maximizando o desempenho e minimizando o consumo de energia. Sem um alinhamento ultrapreciso, essas vantagens seriam impossíveis de se concretizar.

Vantagens e desafios da nova técnica com uso de lasers

A nova técnica de alinhamento holointerferométrico apresenta diversas vantagens em relação aos métodos tradicionais. A mais perceptível é sua sensibilidade sem igual, capaz de detectar deslocamentos em escala subatômica — aproximadamente 0,017 nanômetros para desalinhamentos laterais.

Outra vantagem é a simplicidade do sistema: requer apenas um laser e uma câmera focada no infinito, eliminando a necessidade de microscópios complexos ou sistemas de imageamento sofisticados. Essa simplicidade pode significar menos custo e maior acessibilidade no futuro.

“O alinhamento de chips é um grande desafio custoso para algumas das empresas que trabalham na fabricação de ferramentas para semicondutores”, afirma Arbabi. “Nossa abordagem resolve um dos desafios de fabricação”.

Além disso, o método não requer imageamento microscópico e pode medir simultaneamente desalinhamentos laterais e axiais a partir de uma única imagem, acelerando o processo de alinhamento.

Entretanto, a implementação da tecnologia também enfrenta desafios. Não está claro se o sistema pode ser facilmente integrado às ferramentas de litografia existentes, equipamentos de ligação e formação de vias através do silício (TSVs). Se a integração for difícil, a adoção industrial pode ser limitada.

Além disso, o sistema requer metalentes especiais gravadas nas superfícies dos chips, o que adiciona etapas ao processo de fabricação. A estabilidade mecânica do sistema também é crítica, já que vibrações podem afetar as medições ultraprecisas.

Computadores conseguem ler desalinhamentos indetectáveis ​​a olho nu, como ilustrado por este desalinhamento lateral de 10 nm (Imagem: Reprodução/Amir Arbabi)

Cenários de uso e benefícios para a indústria e para o consumidor

As aplicações desta nova técnica de alinhamento vão além da fabricação de chips convencionais. O método pode ser fundamental para viabilizar a próxima geração de chips 3D e heterogêneos, onde diferentes tipos de componentes são integrados verticalmente.

No setor industrial, essa tecnologia pode reduzir significativamente os custos de fabricação ao simplificar um dos passos mais complexos na produção de chips, tornando o méotodo mais acessível para empresas menores e startups que buscam inovar no campo dos semicondutores.

Arbabi destaca que a novidade também pode ser adaptada para criar sensores de deslocamento ultrassensíveis: “Muitas quantidades físicas que você deseja detectar podem ser traduzidas em deslocamentos, e a única coisa necessária é um laser simples e uma câmera.” Por exemplo, “se você quiser um sensor de pressão, poderia medir o movimento de uma membrana”. Qualquer fenômeno que envolva movimento (vibração, calor, aceleração) pode, em teoria, ser monitorado pelo novo método.

Para os consumidores, os benefícios a longo prazo podem incluir dispositivos eletrônicos mais potentes, menores e energeticamente mais eficientes. Chips 3D bem alinhados permitem maior densidade de componentes e mais desempenho sem aumentar o tamanho físico dos dispositivos.

Além disso, a mesma tecnologia pode levar ao desenvolvimento de sensores mais precisos e acessíveis para aplicações como monitoramento ambiental, diagnósticos biomédicos e sistemas de automação industrial, impactando positivamente diversas áreas da vida cotidiana.

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