De elite à expansão: concorrência por medicina despenca 60% após ‘boom’ de vagas no Brasil

Concorrência para vagas em cursos de Medicina tem queda na última década

Concorrência para vagas em cursos de Medicina tem queda na última década – Foto: Unsplash/Reprodução/ND

A concorrência para ingressar na graduação em medicina caiu 59,5% em nove anos — de 46,51 candidatos por vaga em 2014 para 18,81 em 2023 — segundo aponta estudo Demografia Médica, realizado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Os dados foram divulgados nesta quarta-feira (30).

Enquanto a procura de candidatos pelo curso teve ligeira redução entre 2014 e 2023 (queda de cerca de 9,5% no número absoluto de candidatos nas seleções), a oferta de vagas mais que dobrou.

Mesmo assim, o ingresso na medicina continua sendo um dos mais competitivos entre os cursos de graduação. A área supera tanto outros cursos da área da saúde, como enfermagem, odontologia e farmácia, quanto cursos considerados “tradicionais” de outras áreas, como direito e engenharia civil.

Aumento de vagas em cursos de medicina faz Brasil ter proporção de formados próximo a de países de maior renda

Aumento de vagas em cursos de medicina faz Brasil ter proporção de formados próximo a de países de maior renda – Foto: Canva/ND

Fatores que influenciam na procura

A relação candidato-vaga difere significativamente entre faculdades públicas e privadas. As públicas tiveram, em 2023, uma concorrência quase dez vezes maior do que as particulares, refletindo, dentre outros fatores, as altas mensalidades dos cursos de medicina.

O porte do município que abriga o curso e a idade da instituição que o oferta também afetam a concorrência do curso de medicina. Quanto menor é o município, menor é a concorrência. Por outro lado, quanto mais antiga é a escola médica, maior é a relação candidato/vaga.

Mulheres são maioria com vagas em cursos de medicina

O perfil dos estudantes de medicina também foi traçado pelo estudo a partir de informações do Censo da Educação Superior do Inep: majoritariamente mulheres, brancas, com menos de 24 anos e com ensino médio em escola particular.

Apesar de a maioria dos estudantes da área ser do sexo feminino há anos, somente em 2023 a maioria de médicos passou a ser de mulheres, revelou o estudo.

Instituições privadas têm mais de 90% das vagas em cursos de medicina no país

Entre 2014 e 2023, foram autorizadas 27.921 vagas em cursos de medicina, quatro vezes a mais do que na década anterior. Desde 2014, mais de 90% das novas vagas abertas foram em instituições privadas.

Proporcionalmente, o ensino médico público atingiu seu menor patamar histórico em 2024, quando apenas uma em cada cinco vagas de graduação eram públicas.

Instituições privadas têm maior concentração de vagas em cursos de Medicina

Instituições privadas têm maior concentração de vagas em cursos de medicina – Foto: Canva/ND

Mario Scheffer, professor da FMUSP que esteve à frente do estudo, afirma, com base nas avaliações do Enade, que as escolas privadas têm capacidade inferior às públicas em formar bons médicos.

“Precisamos ampliar a formação de médicos nas instituições públicas de excelência e aproximar mais a qualidade de formação das privadas dos melhores indicadores das públicas”, pontua.

Scheffer destaca que indicadores mostram que, apesar do esforço, instituições privadas ainda estão atrás das públicas. “O dobro de alunos por docente, muito pouco professores de dedicação exclusiva e piores desempenhos em todas as avaliações disponíveis”, conclui.

São Paulo e Minas Gerais concentram quase um terço das vagas de medicina. Dentre as regiões do País, o Sudeste tem a maior concentração de vagas, seguido do Nordeste, região onde houve um aumento substância de abertura de cursos desde 2023.

Apesar de ainda haver desigualdade da distribuição das vagas pelo país, o índice melhorou ao longo dos últimos anos. Em 2004, 51,2% das vagas oferecidas estavam concentradas nas capitais. Já em 2024, o índice caiu para 34,8%.

Apesar de aumento de vagas em cursos de medicina, distribuição ainda é desigual

O estudo identificou ainda que o aumento de vagas de medicina levou a um aumento significativo na oferta de médicos formados anualmente no país, aproximando o Brasil das densidades médias observadas em países de maior renda.

“No caso do Brasil, com o aumento no número de vagas em escolas médicas, o País, com taxa de 16,06 médicos graduados por ano, já supera a média e se encontra próximo a nações europeias, como Áustria (16,19) e Portugal (15,99)”, compara o estudo Demografia Médica.

Mesmo com aumento de vagas em cursos de medicina, regiões interioranas possuem proporção baixa de médicos por habitante

Mesmo com aumento de vagas em cursos de medicina, regiões interioranas possuem proporção baixa de médicos por habitante – Foto: Pixabay/Divulgação/ND

Apesar da alta de formados anualmente, a densidade total de médicos por 1.000 habitantes ainda deixa o país abaixo da média de integrantes da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), de 3,70.

O Brasil tem uma taxa de 2,98 médicos por mil habitantes, acima de nações como Estados Unidos e Coreia do Sul, mas abaixo de outras 32 nações pertencentes à OCDE (são 47 países na organização ao todo).

Apesar disso, a dispersão geográfica de médicos ainda é bastante desigual entre as capitais e as cidades interioranas, assim como entre as regiões do país, em 2023, havia 3,77 médicos por mil habitantes no Sudeste, enquanto a razão no Norte é de apenas 1,70.

O programa federal do Mais Médicos visa sanar essa alta concentração médica em determinadas regiões do Brasil, enquanto outras continuam desassistidas, por meio da abertura de novos cursos em municípios cuja relação de médicos por habitantes é inferior à média da OCDE.

*Com informações de Estadão Conteúdo

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