IA no Combate ao Câncer: Startup Brasileira É Premiada em Harvard

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Willian Peter Boelcke cursava o último ano do ensino médio — integrado ao curso técnico em administração de empresas — na ETEC Trajano Camargo, em Limeira, interior de São Paulo, quando seu pai foi diagnosticado com um câncer de pele avançado, em estado de metástase. “Encontramos o câncer dele por causa de uma pinta. E, depois que ele faleceu, tudo mudou drasticamente”, relembra o cirurgião-dentista de 29 anos.

O desejo de cursar economia e seguir carreira na área, por exemplo, deu lugar a formação em odontologia pela Universidade Federal de Campinas. “Eu passei muito tempo com ele no hospital e essa experiência me fez querer trabalhar com isso”, conta. Inclusive, a escolha da Universidade se deu pelo carinho de Boelcke pela instituição onde seu pai recebeu o diagnóstico e o tratamento.

Nos últimos 10 anos, entre a graduação, iniciações científicas e o início de um doutorado em Biologia Buco-Dental, o paulista buscou formas de transformar o trágico episódio familiar em um motor para auxiliar pacientes na mesma situação. “Poucas pessoas vêem que a odontologia é sobre qualidade de vida. Muitos pacientes oncológicos têm problemas na boca, um agravante negligenciado”, diz Willian.

O doutorando estava preparado para aprofundar seus estudos em biologia molecular e migrar definitivamente para a clínica hospitalar quando um encontro inesperado redefiniu seus planos — mais uma vez. “Há uns dois anos, mais ou menos, eu conheci o Lucas [Lacerda de Souza], meu sócio. Ele também fez odontologia, mas a especialização dele foi em inteligência artificial. Juntos, decidimos criar uma startup que pudesse unir os dois mundos, a IA e a medicina.”

Reconhecimento de Harvard

Assim nasceu a AI Pathology, startup escolhida pela quinta edição do hackathon de inovação em sistemas de saúde, promovido anualmente pela Escola de Saúde Pública de Harvard, para participar do exclusivo programa de incubação e investimento de uma das mais prestigiadas instituições do mundo.

Na divulgação oficial dos vencedores, a descrição da iniciativa brasileira é a seguinte: “O Nevo, seu principal aplicativo web, facilita o rastreamento precoce de lesões cutâneas por meio de fotos capturadas com smartphones. Adaptado para atender a diversas origens étnicas, ele se concentra na ampla gama de tons de pele encontrados no Brasil. O aplicativo utiliza um modelo de aprendizado profundo para analisar imagens, agilizando o processo de rastreamento e agilizando consultas com dermatologistas.”

Nevo é o “nome técnico de pintas”, comenta o co-fundador. A ideia para o primeiro produto da startup foi justamente a demora para o diagnóstico do pai. “Nós tivemos que perguntar para o dermatologista se tinha alguma pinta ou outro sinal para analisar. Foi assim que descobrimos o câncer. Então, eu pensei: ‘Poxa, se todo mundo tivesse uma ferramenta de triagem nas mãos.’”, recorda Willian.

Foto de Willian Peter Boelcke, co-fundador e CEO da AI Pathology

Foto de Willian Peter Boelcke, co-fundador e CEO da AI Pathology

A escolha por um aplicativo disponível de forma online, ou seja, sem a necessidade de download, está alinhada ao objetivo da dupla: democratizar o acesso a cuidados com a saúde. “A gente desenhou o app para funcionar em UBS, em lugares que não tem muita estrutura e os celulares não são tão robustos. A IA só é democrática quando ela aprende em um lugar diverso”, reforça o CEO da startup.

Para desenvolver o Nevo, o time de Lucas Lacerda, COO e líder das iniciativas tecnológicas do negócio, apostou em um método chamado “Convolutional Neural Network” (Rede Neural Convoluciona, em tradução livre), um algoritmo de aprendizado profundo utilizado para analisar dados visuais. “O pessoal fala muito de IA generativa, mas ela é só um modelo. Existem infinitos outros, como o que utilizamos. Desenvolvemos nosso algoritmo para identificar diferentes tipos de lesões e encaminhá-las de acordo com a necessidade. Hoje, nossa assertividade varia entre 96% e 98%”, destrincha Boelcke. 

Captação nos EUA e novos negócios

Desde o reconhecimento de Harvard, a AI Pathology conquistou a atenção das Big Techs, Google, Nvidia e Oracle já abriram as portas (e os sistemas operacionais) para os empreendedores, e de investidores-anjo, entre médicos renomados e empresários. Além do coração da inovação médica no Brasil, com o apoio do Inova HC, centro de inovação do Hospital das Clínicas, em São Paulo, do Hospital AC Camargo e do Grupo Fleury.

No entanto, o mercado internacional é a principal aposta dos co-fundadores para o futuro da startup — que, inclusive, já planeja submeter o algoritmo ao Food and Drug Administration (FDA), agência regulatória dos EUA. “Nos Estados Unidos, o apetite para o risco é muito maior”, pontua o cirurgião-dentista, que aguarda ansioso pela ida à Cambridge, onde apresentarão a AI Pathology para possíveis investidores. 

Curativa

Se tudo correr conforme o esperado, o próximo passo da startup é um novo produto. “Começamos a concepção de um novo algoritmo, chamado ‘curativa’. Ele surgiu a partir de uma demanda de professores do Hospital da Escola Paulista de Medicina, que buscam por soluções para a diminuição de infecções pós-cirúrgicas”, anuncia Willian.

A nova ferramenta funcionará por meio de um “robô” de acompanhamento no WhatsApp. Os pacientes receberão mensagens diárias sobre quais medicações devem tomar, quando devem trocar curativos e limpar a área operada, além de solicitar fotos da cirurgia com perguntas sobre dor e febre. Desta forma, o programa analisará o conteúdo da conversa e, a depender das respostas, encaminhará o atendimento para o especialista adequado.

“Em alguns anos, não existirão antibióticos para as infecções existentes. Com esse bot, eu conseguimos intervir antes que a infecção se espalhe.”

“De zero a mil vidas”

“O pessoal não faz aquela contagem: ‘‘do zero ao milhão.’ A gente vai fazer ‘do zero a mil vidas salvas.’”, celebra Boelcke. Com um sorriso largo, o CEO afirma que já conhece cinco casos de pessoas diagnosticadas de maneira precoce com o Nevo. “O caso mais recente é do nosso CFO. Um dia ele me perguntou se o app estava funcionando, eu respondi que sim e encaminhei o link de acesso. Quando a foto que ele enviou foi analisada, o resultado deu vermelho, o que aponta a necessidade de uma análise médica com urgência. De fato, era um câncer. Ele operou e hoje está bem.”

“Eu sempre falo para a minha equipe que a gente busca impacto, principalmente social. Vamos ajudar pessoas, independentemente da classe social. Eu sei de tudo o que a minha família passou por causa do câncer do meu pai. Se tivesse esse tipo de tecnologia antes, a gente poderia ter vivido um caminho diferente. Tudo o que eu faço em relação à empresa é sobre propósito. É sobre o porquê”, finaliza o jovem empreendedor.

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