Magra, na Moda e Medicada: a nova (velha) silhueta da moda

Parece que a moda encontrou uma forma “prescrita por especialistas” de trazer de volta o culto à magreza extrema, e sabe o pior? Tudo ao nosso redor está disposto a sustentar isso. A indústria da moda, a alimentícia e a dos suplementos estão em sintonia. E o corpo real? Esse ficou de fora da conversa.

Modelo desfila em passarela usando top com estampa de coração e saia rendada longa, segurando bolsa e vestindo boné rosa. Na moda

Foto: Namilia (Getty Images)

Era uma vez a promessa de um novo futuro para os corpos diversos na moda. Passamos a década ouvindo termos como “inclusão”, “representatividade” e “body positivity” ecoarem nas redes sociais e em campanhas publicitárias. Cinco anos depois do que parecia ser o começo de uma revolução estética, estamos de volta a um déjà-vu fashion: o culto à magreza extrema. E desta vez, com direito a receita médica e sobremesa.

O retrocesso vem através dos dados  — e eles são chocantes. Na temporada primavera verão 2020, 86 modelos plus size desfilaram nas principais semanas de moda, representando 2,8% dos corpos nas passarelas. Em 2025, esse número caiu para meros 0,3%. 

O recado é claro: a indústria está fechando a porta que ela mesma “abriu” — porque, vamos combinar, podemos falar que fingiu abrir, né? Afinal, 2,8% de modelos plus size ser o ponto alto da inclusão é uma piada. Se esse é o auge, então a régua sempre esteve baixa demais.

Em Londres, cidade que já vinha se destacando na representatividade de corpos maiores, o número caiu de 80 modelos em 2024 para 26 em 2025, uma redução de 68%.

Mas por que isso está acontecendo? A resposta pode estar em um 360 curioso — e perigoso — que a moda e a cultura estão fazendo: de um lado, o surgimento e popularização de medicamentos como Ozempic e Mounjaro, que oferecem uma magreza rápida e altamente viciante (esteticamente e socialmente); do outro, uma avalanche de campanhas publicitárias que colocam comida no centro das imagens, mas raramente nos corpos de quem as protagoniza, afinal a comida é um adereço, não um alimento. 

Ciclo da moda e corpo: magreza cultuada, celebridades emagrecem, alimentos e marcas populares influenciam.

Foto: Gráfico (Reprodução)

Bolos em editoriais, sorvetes em campanhas, cheeseburgers como acessórios fashionistas. Existe algo mais cruel do que encher as vitrines de imagens comestíveis, enquanto os corpos reais, que poderiam degustar, estão sendo apagados da cena?

A nova magreza da moda não só voltou com tudo como voltou com um QR Code pra farmácia e uma baguette que não se come, mas se pendura no ombro.

Essa combinação de modelos cada vez mais magras, injeções de emagrecimento e campanhas gastronômicas cria um paradoxo visual: tudo parece delicioso, mas ninguém ali está comendo. Literalmente.

E não se engane, a magreza medicamentosa não está só no mundo da moda. Gigantes do ramo alimentício já estão desenvolvendo produtos específicos para quem usa essas medicações, como alimentos adaptados às necessidades de quem toma GLP-1. Além disso, Kourtney Kardashian apresentou recentemente uma linha de suplementos da Lemme pensada para “acompanhar o seu Ozempic”.

O que estamos vendo não é só uma mudança estética. É uma mudança cultural, que traz um retrocesso não só em como mulheres veem seus corpos, mas como se alimentam, como se vestem, como emagrecem. Para uma indústria que se autoproclama inovadora, criativa e disruptiva, voltar ao padrão da magreza extrema não é só perigoso: é entediante.

Enquanto isso, vale lembrar: corpos não são tendências. E quem insiste em tratá-los assim, corre o risco de ser deixado para trás.

Enquanto os anos 90 tornou aceitável — e até glamouroso — estar magra e sofrendo em silêncio, o ano de 2025 inaugura uma nova versão desse mesmo roteiro: agora, o normal é estar magra e medicada. A estética do sacrifício continua viva, só trocou o jejum pela seringa.

Fica o questionamento: qual é o gatilho? São os consumidores que impulsionam a indústria, assim como a moda de rua inspira as passarelas? Ou é um movimento calculado da própria indústria que nos faz acreditar que o corpo ideal imposto é o corpo que queremos?

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