Qual livro você levaria para uma ilha deserta?

Foi lendo o livro O Mundo Desdobrável, da Carola Saavedra (presente de uma grande amiga que mora longe, mas se faz perto), que dei de encontro com essa pergunta.

Existem várias formas de tomar essa decisão fundamental — fundamental eu digo porque, imagine estar presa em um lugar sem ninguém pra conversar além de suas próprias caraminholas, e não ter um refúgio embaixo do braço? Ou se, se isolar numa ilha deserta for, na verdade, um desejo — decisão que entendo profundamente e cogito umas duas vezes por semana —, não ter a companhia de uma boa leitura me parece, no mínimo, um grande desperdício.

As possíveis formas de abordar essa escolha me encantam.

Leitura de um livro na praia, com areia nas pernas e óculos de sol ao lado.

Foto: Catarina Gavassi (Reprodução)

mas como escolher o livro perfeito?

Se você pensa em conforto, talvez a melhor leitura seja a que te dê esperança de que está ruim, mas vai melhorar. Nesse caso, minha recomendação é o surpreendentemente profundo A Biblioteca da Meia-Noite, de Matt Haig, que te faz pensar, repensar e pensar outra vez os “e se” dessa vida, levando você a viajar pelos infinitos rumos que a vida pode tomar, para no final chegar à libertadora conclusão de que não existe a vida que deveríamos estar vivendo — existe a vida que vivemos. Esse livro me ajudou a lembrar que a vida não é algo que se resolva; a graça está no sentir.

Você pode, assim como eu, usar a técnica: se minha situação está complicada, o que resta é me alienar em uma muito pior. A abordagem catastrófica me atrai, não vou mentir — e para ela não faltam caminhos. Você pode, por exemplo, optar por leituras de viés político, análises sobre a conjuntura do nosso país que, convenhamos, nos levam a concluir que está ruim e possivelmente vai piorar muito antes de começar a melhorar. E, para esse caminho, meu preferido dos últimos tempos: Políticas do Encanto — Extrema-direita e Fantasias da Conspiração, de Paolo Demuru, que nos ajuda a entender, entre tantas outras excelentes análises, o porquê de o discurso de ódio ter ganhado tanta força nos últimos anos.

Pesei o clima, né? Catastrófica e bem informada — costumo fazer isso mesmo. Mas bola pra frente.

Praia com livro aberto sobre toalha vermelha, pernas cruzadas e vista do mar ao fundo.

Foto: Catarina Gavassi (Reprodução)

Uma outra forma de seguir viagem seria levar um livro de contos. Dessa forma, você consegue mergulhar não só em uma, mas em várias histórias encantadas. E, se é pra falar de encanto: Seminário dos Ratos, de Lygia Fagundes Telles. Leia. Aí leia uma segunda vez para começar a achar que entendeu alguma coisa — e me agradeça mais tarde (via mensagem na garrafa, visto que estará na ilha!). Uma leitura que navega entre o fantástico e o trágico para retratar a condição humana.

Agora, se para você leituras breves, mas intensas, são a pedida: poesia! Se deixar devanear, deitada na areia de frente para o mar, tem seu charme — e isso ninguém pode negar. Para essa recomendação, minha lista é longa, mas optei pelo livro da minha coleção que tem mais areia entre suas páginas: Jóquei, de Matilde Campilho. Já foi comigo para infinitas praias e algumas ilhas. Livro curto, mas que dobra de tamanho quando você se deixa viajar em cada um dos versos.

Livro aberto sobre toalha vermelha no gramado, com lápis entre as páginas.

Foto: Catarina Gavassi (Reprodução)

Se você quiser roubar, por exemplo, recomendo uma saga. E de sagas não sou tão entendida, então agora quem rouba sou eu: o box de livros da Carla Madeira. Prosa poética extremamente envolvente com um quê de fofocaiada muito, muito bem escrita — onde o único perigo é ler tudo de uma vez só.

Livro

Foto: Catarina Gavassi (Reprodução)

Bom, sem mais enrolação porque o papo agora é de preferido. Qual o livro que eu levaria para uma ilha deserta? Acho seguro dizer que levar seu livro preferido para uma ilha deserta deve, sim, ser o caminho mais assertivo: Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres, de Clarice Lispector. 

Uma leitura existencialista (amo de paixão) que me salvou da cilada de acreditar que ser feliz o tempo todo é, primeiro: o que devemos desejar na vida e, segundo: possível! E me apresentou algo que eu adoro levar comigo: o estado de graça. Não sou de reler livros, isso devo admitir, mas esse a cada vez que leio é um livro novo. Meu oráculo, minha mais feliz companhia e meu livro preferido.

Seja qual for sua escolha, de uma boa leitura sempre saímos transformados. E estar na companhia de um livro vai para sempre nos salvar da solidão — a das ilhas desertas ou as tantas outras que nos acompanham.

Boa viagem — e não esquece o protetor solar!

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